domingo, 5 de agosto de 2012

Eloísa & Damião

Uma reunião de amigos e conhecidos, nem tão jovens adultos esforçando-se ao máximo para aparentar uma vitalidade deixada na casa dos vinte e cinco.
Eloísa estava com trinta e indisposta demais para fingimentos, perdida em um torpor de cerveja e tédio.

Abrindo caminho entre os transeuntes, algo entrara em seu campo de visão, possuindo notoriedade suficiente para arrancá-la de suas divagações. Seus olhares se cruzaram, e devido à intensidade com que aquele olhar foi sustentado, o ambiente envolvendo-o passava em câmera lenta. Tão clichê, tão estratégico, quanto cena de algum drama romântico, como se os Deuses, na ausência de outras distrações, viam no destino de reles mortais um pretexto para fazer cinema.

Ao tombar com aqueles olhos de menina, nos quais o tempo tratou de perpetuar a inocência já lavada do espírito, Damião foi atingido por um fluxo de lembranças. Se não as evitava ou combatia, tampouco as desejava.

Com Eloísa não foi diferente. O ar de superioridade preservado pelo comportamento de Damião desconcertava-a, desconfortava-a, evidenciava a indestrutibilidade de determinadas características, mesmo com a ação de tanto tempo. Mostrava que certas coisas nunca mudavam.

Na figura daquela mulher, na qual poucos resquícios de juventude luminosa eram perceptíveis atrás de camadas de maquiagem, ele enxergava sua juventude eufórica, sem limites, passando em flashs sob seus olhos embaçados de nostalgia.

Aqueles olhos negros, caídos, cansados, rodeados por olheiras de quem nunca pegava no sono ou dormia demais, envolviam Eloísa num borbulhar de sentimentos, pensamentos e confusões típicos da juventude, inibidos pela sensatez obrigatória da visão adulta do mundo.

Pois analisando-se mutuamente, Damião e Eloísa enxergavam o que foram.

E com que pesar tiveram de encerrar aquele flerte, evitando outro durante toda a festa. Afim de não levantar suspeitas. Ou fortalecer as lembranças.

8 comentários:

  1. Acho que essa é a primeira vez que visito teu blog, Beatriz, e posso dizer que devo voltar mais vezes. Gostei muito do teu estilo de escrita e queria conhecer melhor Eloísa e Damião. :)

    :*

    http://hey-london.net

    ResponderExcluir
  2. É engraçado como essas coisas acontecem. E de repente, um olhar vira uma história, um amontoado de palavras. Um amontoado de palavras que por milésimos de segundo, desejaram ser um livro.

    Gostei muito dessa parte:"Tão clichê, tão estratégico, quanto cena de algum drama romântico, como se os Deuses, na ausência de outras distrações, viam no destino de reles mortais um pretexto para fazer cinema."

    Adorei mesmo, até postei esse trecho no meu facebook. Com os devidos créditos, claro.

    Aliás, vim agradecer também seus elogios lá no Infinita Liberdade. Postei um novo conto hoje. Se puder, dê uma olhada e deixe sua opinião,okay?

    Um beijo, Misunderstood.

    ResponderExcluir
  3. É, e novamente, vemos como esses tais olhares são responsáveis por tantas divagações, sobre os outros e sobre nós mesmos. Fiquei triste porque Eloísa e Damião pararam com o ~flerte~, acho esses momentos muito interessantes. IUDHIAUHSD
    Texto muito bom, como sempre!
    Beijos.

    ResponderExcluir
  4. Seu conto me envolveu do início ao fim. Ótima escolha de tema, enredo, desenvolvimento da história, ótima em todos os aspectos. Esse seu texto, me instigou a ler os outros, que já escreveu. Senti-me desafiada a encontrar um conto melhor que o acima, pois, na minha tão humilde opinião, conseguiste atingir à perfeição. Você tem MUITO talento.

    ResponderExcluir
  5. Tenho que agradecer a sua presença em meu cantinho e me desculpar pela demora em responder. Fico contente que meu texto tenha lhe emocionado. E saiba que adorei o seu texto também. E o seu blog. Pode me linkar sim, moça.
    Um beijo, @pequenatiss.

    ResponderExcluir
  6. O cabeçalho do blog tá lindo *-*, inveja roxa.
    Dá uma olhada lá no meu: http://tinyurl.com/9dmvjkn.

    ResponderExcluir
  7. "Na figura daquela mulher, na qual poucos resquícios de juventude luminosa eram perceptíveis atrás de camadas de maquiagem, ele enxergava sua juventude eufórica, sem limites, passando em flashs sob seus olhos embaçados de nostalgia."

    Logo depois fala sobre "parar pra não fortalecer lembranças". Cara, tava falando sobre isso num outro blog AGORA. A minha diferença é que agarro qualquer chance de fortalecer o que passou, as coisas suspensas naquela dimensão onde não estão mortas mas não estão vivas. São presentes, sim, mas não respiram, não podem ser vividas com a carne. Menos para amores, mais para família, amigos, lugares, situações. Em romances, ainda não pude experimentar o que aconteceu aqui no texto, mas em outros espectros, cara... que tormento.

    Não vou citar aqui, mas o segundo parágrafo está es-pe-ta-cu-lar. Parabéns.

    E vamos beber juntos, agora que voltei a usar a internet feito gente. Espero que se lembre de mim, senão a porrada come. Ou não, né.

    ResponderExcluir