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quinta-feira, 10 de julho de 2014

Mulher de Camafeu

Sabe aquela sensação de que você poderia ter desenvolvido a ideia melhor ao decorrer da narrativa? Pois é, após muitas tentativas, eu ainda continuo com ela. Contudo, a consciência de que estou enferrujada na escrita e de que esta dificuldade só pode ser solucionada escrevendo - ah, não me diga?! - concluí que postar o conto - mesmo ele não atingindo meus padrões pessoais (cof cof) de qualidade literária - é mais eficiente do que rejeitá-lo e deixar o blog no marasmo. 

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Ele aproximou a vela de uma das ires, que dilatadas pela luz, deixaram ainda mais cristalino o tom caramelo dos olhos de Diana. Marcus iluminou o outro olho, antes de abaixar e soprar a chama, e enquanto a dona dos olhos piscava freneticamente, ajeitou uma mecha relutante de seu cabelo, prendendo-a atrás de sua delicada orelha.
  
A jovem sorriu, cabisbaixa. Um sorriso sutil, assim como a beleza de suas feições. Diana era toda miúda, de corpo, de rosto, lábios, nariz, orelha, gestos, palavras...Seus olhos redondos eram as estrelas de sua face, o que lhe trazia luz. Mas há muito tempo não brilhavam como outrora. Estavam cada dia mais dispersos, aéreos, perdidos no nada, ou em algo da qual a dona era a única expectadora. 
  
Psiquiatra, Marcus assistira muitos casos sobre aquela espécie de Melancolia. Sabia que tratava-se de uma doença sem origem explicável, esperta e venenosa, que consumia um indivíduo por sua raiz: a alma. Temia que a primeira ventania que escapasse pela fresa da janela levasse a alma de Diana, como era capaz de fazer com uma trêmula chama de uma das velas que iluminavam o quarto. 
  
Sentindo a fragilidade da pele acobreada da mulher, o médico acariciava aquele rosto pequeno, em formato de coração, correndo o dorso da mão por seu contorno. Recolhendo a mão do esposo com as suas, Diana a aproximou de seus lábios, beijando-a carinhosamente. 
  
Marcus encarou a esposa. Esquadrinhou cada canto daquele belo rosto, magicamente delineado pela luz tremeluzente dos candelabros do quarto. 

Os olhos grandes e dourados, profundos; a tez morena, o nariz fino e levemente arrebitado; as bochechas que estavam mais salientes do que costumavam ser. Em anos de casamento, nunca vira a esposa tão bela como sob aquela penumbra. Suas feições, mesmo cansadas pela doença, assemelhavam-se as de uma criatura surreal, etérea… “Uma mulher de camafeu!”, pensou. 

Eternamente aprisionada por uma moldura invisível. 
  
Empurrando delicadamente seus ombros para a cama, puxando o cobertor e ajeitando o travesseiro, o médico a acomodou no leito, antes de beijar-lhe os lábios, depois a testa, desejando mentalmente a ela uma noite tranquila, sem pesadelos ou insônia. 
_ Obrigada. - sussurrou Diana antes de fechar os olhos. 

“Teria aquele encontro de olhares revelado seus pensamentos?” - se questionou o médico, observando o sereno repouso da esposa, antes de trancar o quarto. Ao lado da porta, uma última vela acessa, que com um sopro, se apagou.

Assim como Diana.