Costumava
escrever romances. Costumava cobrir-se de renda. Costumava transbordar
sentimentos, ora se derretendo em lágrimas e lamúrias, ora exultando
felicidade. Costumava buscar um grande amor, e temer enlouquecidamente a
solidão. Hoje busca outras coisas, e ainda a teme.
E ao se encarar
no espelho do banheiro, seu reflexo distorcido pela fumaça de um banho quente,
ela abre a portinha do armário, e certeira, retira, entre escovas e pastas de
dente, esponjas, pinças de sobrancelhas e lâminas de barbear, seu batom
vermelho. Corre a palma da
mão pela superfície embaçada, certificando-se de tornar nítido apenas o reflexo
dos lábios. Desliza o bastão por eles, e logo, se tornam carmim. Ela sorri. Aquele
sorriso que aprendeu a congelar em sua expressão diária, de um tom cordial.
Educado e inexpressivo.
E embora não
chore com a mesma frequência que costumava o fazer, também não costuma rir com
facilidade. Neutra, com o tom nublado que viu gradativamente cobrir a cidade,
quando abriu a janela de manhã, vendo o sol tímido deixar céu, cedendo seu
lugar à uma chuva fina e ininterrupta. Correu pela
avenida, deixou o guarda-chuva fechado, deixou a fina chuva molhar seu rosto,
cobrir de gotinhas miúdas seus cabelos crespos. Deixou-se limpar de toda aquela
morbidez, o marasmo no qual seu espírito mergulhou,
Pediu para ter
no céu da boca o cintilar de emoções intensas. Pediu para ter a flor na pele.
Pediu para se apaixonar. Pediu para se enfurecer.
Pediu pra se sensibilizar.
Pediu pra se sensibilizar.
Como uma borboleta que após ter asas escurecidas pelas
sensações urbanas pelas quais sobrevoou, recorda saudosamente seus sentidos de lagarta.
Eu particulamente amei. Me fez pensar nas nossas mudanças, no nosso amor próprio. Estou apaixonada!
ResponderExcluirVocê fez o desenho?? Ficou demaaaais!
ResponderExcluirO desenho combinou tanto com o texto...
ResponderExcluirwww.bybiancaconde.com.br
Muito bom.
ResponderExcluirNão é pouca verdade essa de que a serenidade e a sanidade vão embora nesse cinza diário. Ainda bem que a praia não tá tão longe, haha (:
Essa metáfora da borboleta, tão cara a tantos de nós... Adorei o texto.
ResponderExcluirE quem nunca desejou apenas sentir ne?
ResponderExcluirEu fui em Andrelândia, qual cidade vc foi?
Que lindo! Em momentos assim, precisamos deixar com que a chuva lave nossa alma.
ResponderExcluirAdorei, especialmente, a reflexão nas últimas duas linhas do texto. Muito bom.
Ps: Se fores a desenhista, penso que além de escrever, também tens o dom de desenhar (e passar emoções a partir do desenho).
Imagino essa borboleta voando numa cidade cinza...e ficando sem graça e cinza, tal qual a cidade e os seus habitantes. Coisas da vida
ResponderExcluir::::
{Emilie Escreve}
Achei o texto melancólico e alegre ao mesmo tempo. O tema urbano me agrada, e o compartilhei com a personagem o feeling de hope no final. haha
ResponderExcluirobs: a desenhista é você? Se for, parabéns, eu não desenho nem uma casinha.
Um arquétipo de todas nós? Sim, representa muito bem.
ResponderExcluirA arte de congelar sorrisos de meia-lua. A arte de andar no meio deles mas não ser uma deles.
Lindo.